Cynara Menezes, Carta Capital
Que a polícia baiana é truculenta, todo mundo sabe. O problema é fazer pouco ou nada para mudar isso. Até quando os petistas, no poder no Estado há cinco anos, irão dizer que qualquer questão envolvendo a Polícia Militar é resultado dos desmandos de Antonio Carlos Magalhães? Chega de governar olhando o retrovisor, ou melhor, culpando o retrovisor…
Exército cerca prédio da Assembléia Legislativa da Bahia, onde estão acampados os policiais em greve. Foto: Alberto Coutinho/Governo da Bahia
Em 2008, fui a Salvador fazer uma reportagem sobre o assassinato pela polícia de quatro rapazes, no espaço de apenas 12 dias, durante diligências em comunidades carentes –os famigerados “autos de resistência”, que todos os anos roubam as vidas de tantos jovens no país, principalmente negros. Houve protestos nos bairros atingidos, manifestantes fizeram piquetes e atearam fogo a um ônibus. Até hoje não sei se houve sanções aos policiais envolvidos, o que sinalizaria para o fim da sensação de impunidade que leva, aliás, à “truculência”.
Na época, ouvi de uma socióloga que, de fato, foi ACM quem importou para a Bahia o modelo nova-iorquino de “tolerância zero”, que na terra de Todos os Santos se traduziu na institucionalização do “descer o sarrafo”. Mas, conversando com o governador Jaques Wagner sobre isso, ele falou de sua intenção de formar melhor a polícia e de introduzir novos quadros para tentar reverter esse perfil típico de regimes ditatoriais, tão ao gosto do finado ACM.
“Considero inadmissível que policiais ajam à revelia da lei. Nosso objetivo é aprofundar o conceito de cumprir a lei dentro da lei, de segurança com cidadania”, disse então Wagner. Isso, repito, em 2008. Quatro anos depois, o que vemos é uma polícia aparentemente fora de controle, suspeita, segundo o próprio governador, de ter até matado gente durante a greve que começou no dia de Iemanjá, 2 de fevereiro.
É correto que policiais, para fazer reivindicações, amedrontem a população? Não. Mas tampouco é correto que policiais, numa sociedade democrática, nem sequer tenham suas reivindicações ouvidas pelas autoridades. “Nem plano de cargos e salários eles têm”, diz o professor de Desenvolvimento Urbano Carlos Alberto da Costa Gomes, coordenador do Observatório de Violência da Bahia. Costa Gomes também é contra policiais intimidarem pessoas. Mas adverte que tudo chegou a esse ponto porque há 30 anos os policiais baianos pedem praticamente as mesmas coisas. Ou seja, não foram atendidos por ACM –nem por Jaques Wagner.
A pauta dos grevistas foi reduzida a dois pontos: anistia para os que participaram do movimento e o pagamento da GAP (Gratificação por Atividade de Polícia), que representaria um aumento real de salários para os policiais. Pois essa GAP está esperando há quase 15 anos para ser regulamentada! Antes da última greve, em 2009, Wagner tinha acirrado os ânimos dos PMs ao conceder 54% de aumento aos policiais civis. Reclamando falta de isonomia, os policiais fizeram circular um manifesto intitulado “Governador Jaques Wagner incentiva PM a fazer greve”. O movimento só cessou quando o governador fez promessas que até hoje não cumpriu, como a regulamentação do quê? Da mesma GAP…
Existem muitos erros na condução desse processo e já não é possível debitá-los na conta do falecido ACM. A Bahia é complexa, rica e dessemelhante. Mas a polícia é consequência, não a causadora dos problemas baianos. O que essa greve prova é que as autoridades locais precisam começar de uma vez a planejar melhor o futuro do Estado. E não estou falando de Copa do Mundo.
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