Tábata Pontes já estava estudando na USP; ela é filha de cobrador de ônibus e uma vendedora de flores
Uma medalhista olímpica brasileira, vinda da rede pública de ensino, está prestes a trocar o Brasil pelos Estados Unidos. Tábata Amaral de Pontes, de 18 anos, tem mais de 30 medalhas no currículo, entre competições nacionais e internacionais de física, matemática, química e astronomia, como mostrou o Jornal da Tarde em fevereiro. À época, a notícia era a aprovação dela na Universidade de São Paulo.
Agora, o leque de opções aumentou. Filha de um cobrador de ônibus e de uma vendedora de flores, moradores da periferia de São Paulo, no extremo da zona sul, Tábata foi aprovada em seis universidades norte-americanas: Harvard, Caltech, Columbia, Princeton, Yale e Pennsylvania. Ela concluiu o ensino médio no Etapa, como bolsista.
A felicidade de Tábata só não é maior porque a confirmação da aprovação em Harvard, na quinta-feira, foi recebida três dias antes do falecimento de seu pai. Por conta disso, a jovem não pôde conversar com a reportagem.
Em fevereiro, antes de conhecer os resultados das universidades americanas, Tábata disse ao JT que a experiência poderia ajudá-la a contribuir com “a educação no País”. Ela é fundadora do programa Vontade Olímpica de Aprender, (VOA) que dá aulas de matemática para alunos de colégios públicos. À época, chegou a comentar: “parece impossível passar, mas esse é o meu sonho”.
André Lessa/AE-7/2/2012
Da periferia aos Estados Unidos
Aos 18 anos, Tábata Cláudia Amaral de Pontes já pode se aposentar. Ela é a rainha de competições internacionais e nacionais que pouca gente conhece: as olimpíadas de física, matemática, química e astronomia. Ganhou mais de 30 medalhas mundo afora, algumas com um gostinho especial.
Foi por causa de uma delas, por exemplo, que recebeu uma bolsa de estudos do Colégio Etapa, aos 13 anos, quando ainda estava no ensino fundamental, em uma escola pública da periferia da zona sul. Mas o problema não era apenas pagar pelos estudos.
Tábata levava muito tempo para se locomover entre a escola, na Vila Mariana, e sua casa, na Vila Missionária, região de Cidade Ademar, na zona sul. Além disso, essa era uma despesa que seus pais, uma vendedora de flores e um cobrador de ônibus, não tinham como manter.
De olho no talento da menina, a escola ofereceu moradia em um hotel próximo, alimentação, passagens e curso de inglês. Neste domingo, dia de sua formatura no ensino médio, ela deixa a escola à espera dos resultados em dez vestibulares de instituições norte-americanas, entre elas Harvard e Stanford.
E, se a carreira de atleta olímpica terminou, o talento da menina ainda pode render mais frutos. Já aprovada em Física pela Fuvest e no aguardo de respostas das universidades internacionais, ela ministra aulas de olimpíada no Etapa, para futuros competidores.
Fora da escola Tábata também serve de exemplo: ela fundou projeto social de aulas para alunos da rede pública e ainda incentivou sua mãe a retomar os estudos, concluídos no ano passado, num curso supletivo. No quarto de hotel em que vive hoje, contou ao Jornal da Tarde sobre sua trajetória nos bancos escolares.
Como começou a sua carreira olímpica?
Participei de uma olimpíada (da área de exatas) pela primeira vez em 2005. Estava na 5ª série e estudava num colégio estadual. Fiquei com a medalha de prata da primeira Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep) e, como premiação, ganhei um curso de matemática aos sábados no Colégio Etapa. No ano seguinte, ainda como aluna de colégio público, eu ganhei a olimpíada. Sempre tive facilidade e também gosto das matérias de exatas.
O convite para estudar no Etapa surgiu quando?
Em 2007 fui convidada para estudar lá. Mas não tinha condições de arcar com os estudos e ganhei uma bolsa integral. O convite foi um reconhecimento do meu esforço, eu acho. Mudei para o Etapa na 7ª série e demorei para me adaptar.
Como foi a mudança para uma escola particular?
Não tive dificuldades com as matérias, mas sim para me acostumar com um colégio particular. Tudo é muito diferente. No primeiro ano, fiquei deslumbrada. Tão deslumbrada que, no ano em que entrei no Etapa, acabei deixando as olimpíadas de conhecimento de lado. Imaginava que só de estar num colégio particular estava com o futuro garantido. Só voltei a pensar nas olimpíadas um ano depois, em 2008, já ambientada.
Quais foram as dificuldades com o novo colégio?
No começo, era o deslumbramento. Depois, o problema era financeiro. Gastava muito com transporte e alimentação. Também era uma rotina pesada. Saía 22h30 do Paraíso e chegava meia-noite na casa dos meus pais. Foi quando o Etapa começou a pagar um hotel próximo ao colégio para eu morar durante a semana e ajudar nos custos. Mesmo assim, ainda sofri para me acostumar com a distância dos meus pais.
Por que decidiu retomar as olimpíadas no Etapa?
Eu não fazia parte da equipe olímpica de conhecimento do Etapa. Mesmo assim, por ser medalhista pelo colégio público, fui convidada no final do ano (em 2007) para participar da confraternização da equipe. Eles vestiam uma camiseta especial e falei para o meu pai que, no próximo ano, eu também estaria vestindo aquele uniforme. Parece bobagem, mas vê-los me despertou a vontade de voltar a competir. Nesse mesmo dia, também assisti a uma palestra de um representante do MIT (Massachusetts Institute of Technology) e decidi que iria estudar no exterior.
Como se preparou?
Em 2008 eu descobri as competições de física e me apaixonei. Participei de competições na Turquia, China e Polônia. Foi fácil retomar, porque nas competições você conhece muita gente bacana. É um lugar incrível para fazer amizades. Também entrei na equipe do Colégio Etapa e cumpri a promessa que tinha feito ao meu pai. Passei a estudar e treinar com eles matemática, física, química, robótica e astronomia e a dar aulas num projeto.
Qual o projeto?
Há três anos, criei o projeto VOA, Vontade Olímpica de Aprender, com amigas do Etapa. Sabe, me parecia correto retribuir as oportunidades que eu tive. Nós damos aulas aos domingos de matemática e astronomia para alunos de colégios públicos. Funciona assim: buscamos colégios públicos que queiram montar equipes de conhecimento e preparamos o grupo. Hoje, temos apoio do Rotary Clube e do Etapa. Trabalhamos com oito escolas na zona sul e cerca de 200 alunos já passaram pelo projeto.
As competições internacionais despertaram a vontade de estudar no exterior?
No dia em que assisti à palestra do representante do MIT, eu soube que queria estudar nos Estados Unidos. Mas sabia que teria dificuldade com a língua inglesa. Ex-aluna de um colégio público, meu inglês era fraco. Há dois anos, pelo Etapa, eu também consegui uma bolsa numa escola de línguas. Fiz o curso intensivo para me preparar para os exames da universidades norte-americanas. Sei que lá fora poderei combinar graduações, algo mais difícil aqui no Brasil. Quero estudar astrofísica e ciências políticas ou sociais.
Quais vestibulares você prestou lá fora?
Aguardo o resultado de Harvard, Stanford, MIT, Columbia, Yale, Dartmouth, Caltech, Princeton e Penn (University of Pennsylvania). Prestei Astrofísica e Ciências Sociais e Políticas. Parece impossível conseguir passar, mas é o meu sonho. As melhores cabeças vão estudar nessas universidades. Acho que poderei ajudar depois com a educação no País. É um sonho também.
Algumas vez você já sofreu com cobranças?
Não. Meus pais nunca me cobraram. Minha mãe terminou no ano passado o supletivo do ensino médio. Ela é vendedora de flores e decidiu voltar aos estudos com o meu incentivo. Já meu pai é cobrador de ônibus há pelo menos dez anos. Eles sempre me incentivaram, mas nunca exigiram nada. O colégio também não. ::
TABATA!
ResponderExcluirEstou te assistindo agora no Hulk.
Maravilhoso! Sem palavra para mensurar tal dedicação, consciência própria e com o mundo. Só posso dizer. Parabéns por ser tão brilhante simple e ela forma orgulhoso como fala e apresenta seus pais.
Bjs. Deus a companhe em seus novos caminhos.
Magna Ouriquez,MSc