sábado, 17 de dezembro de 2011

Entrega e paciência para superar a dor

Fonte: Jornal O Dia

POR CHRISTINA NASCIMENTO
      Rio - O choro sofrido de um dos alunos na sala de aula foi decisivo para a professora de Português Leila Maria D’Angelo da Costa, 48 anos. Era o momento de pedir licença da Escola Tasso da Silveira, em Realengo. As lágrimas do menino a comoviam tanto que ela mal conseguia consolá-lo. Sabia que, se desistisse do colégio, não conseguiria encarar os estudantes que dividiram com ela os momentos de terror daquele 7 de abril, quando 12 crianças foram assassinadas em salas de aula. Leila testemunhou a tragédia e foi uma das 5 professoras que pediram licença. Ela e duas colegas já voltaram para ajudar na reinvenção do colégio.


      “Ele chorando, achando que a escola poderia ser novamente invadida, me deixou arrasada. Resolvi me afastar. Minha intenção era me desligar totalmente, mas na rede social alunos não paravam de me mandar recado. Diziam que precisavam de mim. Encontrei neles um respaldo tão grande que, após dois meses em casa, decidi voltar”, contou Leila, que dava aula quando Wellington Menezes de Oliveira entrou na turma 1803 atirando. Ali, três alunos morreram.
      No mês seguinte à tragédia, cinco professoras pediram licença — duas não voltaram ainda, entre elas a que escapou da sala assim que começou o massacre. Os pais passaram a hostilizá-la por isso.
      Reinventar o processo de dar aula foi o caminho que a maioria dos educadores da Tasso da Silveira escolheu para continuar em sala. A mudança de comportamento nas turmas era um desafio: alunos ficaram tão agitados que boa parte do tempo era usada tentando fazer com que eles se concentrassem.
      Dar aula logo depois do que aconteceu foi sofrido. Durante a reforma, um vidro caiu no chão. As crianças se jogaram debaixo das cadeiras e eu surtei. Decidi tirar licença. Minha família pediu para eu largar tudo, mas há um apego ao grupo muito grande”, contou a professora de Ciências Gisele Mateus, 44, que passou a tomar antidepressivos.
      Situação semelhante à de Gisele é comum nos corredores da Tasso. “Fiquei cinco meses afastada. Comecei com meio comprimido de calmante, mas tive que aumentar. Nunca pensei em deixar a escola ou a profissão. Aquele 7 de abril, foi um dia de exceção”, ensina a professora de Português, Elaine Pais Alves, 44.
Polêmica sobre a aprovação de alunos

      Em meio ao turbilhão de emoções que os professores tentavam administrar após o massacre, um dilema tomou conta das discussões pedagógicas na escola: era justo reprovar os alunos das duas turmas invadidas pelo atirador que não conseguiram nota para passar de ano?


      A preocupação da maioria dos educadores era que no imaginário de muitos dos estudantes da Tasso da Silveira o carimbo de aprovado no boletim era a compensação que deveria vir para quem viveu um massacre sem precedentes. “Cinco dos alunos das classes onde aconteceram aquele triste episódio ficaram de recuperação. Não houve isso de coitadinho. Eles foram aprovados depois, porque conseguiram notas. Sinceramente, não acho que houve queda no rendimento. Quem estudava continuou sendo bom aluno. Quem era regular permaneceu sendo assim”, disse o professor de Matemática Carlos de Oliveira, 64.
      Alguns outros educadores admitiram que houve uma pressão para que todos os alunos fossem aprovados. “Tinha muito professor aqui que tinha receio de não aprovar e passar por mais uma situação desgastante”, contou uma educadora.
      Mas há quem acredite que a receita para superar um ano tão traumático esteja na dedicação. “Nós nos ajudamos. Esse foi o segredo para levar o restante do ano letivo. É claro que foi preciso paciência, carinho e muita dedicação. Mas no fim acredito que conseguimos vencer essa dura batalha”, disse a professora de Francês Maristela Marques Leite, 59, que deu aula para o atirador Wellington Menezes.

      COMENTÁRIO DO BLOG: Não perdendo de vista todo o sofrimento dos pais que perderam seus filhos, e dos que sobreviveram e seus familiares, cabe aqui uma observação de como a sociedade tem toda uma visão distorcida sobre o professor como sacerdote. Que ser humano, diante de tudo o que aconteceu, não teria a reação puramente instintiva de preservar sua vida? A professora que escapou da sala está sendo hostilizada pelos pais.
      Afirmar que na situação se atracaria com o atirador para defender as crianças é bravata fácil para quem não estava la´naquele momento. E aí está, uma profissional que, assim como os seus alunos, foi vítima da falta de segurança, da loucura do atirador, das circunstâncias, ou seja lá o que for. Mas não, por ser professora até o "direito ao trauma"  e à vida lhe é negado pela comunidade escolar. E fica a pergunta: algum destes pais se lembrou de procurar na justiça seus direitos frente ao verdadeiro culpado da tragédia?? Culpar o professor sempre é mais fácil, e extremamente proveitoso para a administração pública.

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