sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O Natal não é mais aquele


Carta Capital

Menalton Braff

Tenho um amigo, que me pede anonimato absoluto, bastante atento a tudo que acontece em nosso velho mundo, do qual ele costuma dizer que vive mudando para continuar sempre igual. Seus comentários são polêmicos, mas ele não gosta de briga, por isso se abriga nas trevas. E aqui refuto suas idéias. Muda, sim, meu anônimo amigo. E muda muito.
Meu amigo afirma que os católicos são de uma ingenuidade inexplicável, tamanhos e tantos são os casos. E ele cita um rosário deles, dos casos, que não cabe repetir no exíguo espaço de uma crônica. Como amostra, vou usar dois exemplos. Alguns de vocês devem estar lembrados do Neimar de Barros. Esse cidadão foi bajulado, requestado, promovido, estimulado, ele foi, bom, foi quase endeusado. E quem se lembra disso é difícil que tenha a coragem de negar o que estou afirmando. Entre outras coisas, esse fraco escritor produziu um livro de capa preta com o título de “Deus negro”. Não havia paróquia onde não se encontrasse à venda o livrinho (mixuruca, por sinal) do Neimar. Cansado de tanto ganhar dinheiro, um dia o Neimar de Barros declarou em uma entrevista a um repórter que tudo que ele escrevia tinha uma só finalidade: ganhar dinheiro. Fora outras afirmações dele a respeito da ingenuidade daqueles que o liam. Foi apeado do pedestal, mas o estrago já estava feito.
Outro exemplo é o bruxo Paulo Coelho. Ele começou a carreira (depois das andanças pela música) dando um tom, como podemos dizer, exotérico a seu texto. Coisas orientais, histórias exóticas, temperos muito ao gosto popular, mas em conflito com o pensamento católico apostólico romano. E havia uma lacuna em sua clientela: o mundo católico não ia muito com sua cara. Ora, mas isso é problema que se resolve muito facilmente. O PC da Academia Brasileira de Letras, a quem não falta dinheiro para qualquer tipo de aventura, viajou para a Europa, mais especificamente para Santiago de Compostela, e lá fez uma viagem famosa, andando a pé coisa aí de uns cem quilômetros e que é o sonho de consumo da maioria dos que professam o catolicismo. Pronto: estavam abertas as portas de mais um nicho de consumidores. A esperteza dele dá nó em fumaça (quem inventou essa expressão foi meu avô, num dia em que ficou tonto de tanto fumar). Conheço muito católico convencido de que o Paulo Coelho comunga, confessa e tudo mais.
Agora por que me veio à lembrança a ingenuidade dos católicos: o Natal, tempos atrás, era uma festa cristã. Comia-se peru, carneiro, leitoa, essas coisas, mas isso era apenas a superfície da data. As pessoas se encontravam para reverenciar o nascimento de Cristo. Havia a Missa do Galo, realizada à meia-noite do dia 24 de dezembro, havia sermões e música sacra, havia o que se pode chamar de alegria saudável, pois festejava-se com respeito o  nascimento do Salvador.
Depois veio a esperteza dos comerciantes e Natal sem presentes tornou-se coisa de gente pobre. Deus que me livre de pensarem que não posso dar um presentinho, que seja. E presente onde é que se compra? Nas lojas deles, é claro. E o caráter religioso da data foi dando lugar a um mesquinho espírito comercial.
Mas a coisa não parou aí. Como é data de encontro, e de alegria, a música sacra também desapareceu do cenário. Em seu lugar, pagode, música sertaneja, tchan, música picante, cheia de malícia (coisas que antigamente se chamavam de pecaminosas). Pois bem, sabe-se muito bem que o carnaval tem uma origem pagã. Pois o Natal, aos poucos, transforma-se também em festa báquica. Vale tudo, em nome da alegria.
Pensando bem, a única diferença do Natal para o Carnaval é a fantasia. No Carnaval ninguém se veste de Papai-Noel. Pelo menos por enquanto.
(Sei muito bem que virão os estudiosos de tudo para contestar minha versão da origem dos presentes, mas isso não fará diferença nenhum. A tradição encontrou nos comerciantes seus mantenedores.)

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